terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Capítulo II - O Retrato

7ª Parte

Antes que o fôlego de que não precisava a abandonasse, seu sisudo pai falou, a voz cortando rajadas gélidas de ar pela sala perdida no tempo. — Ela saberá comportar-se de modo a aquietar-se. — O olhar cru pousou sobre a filha, e Adamina sentiu o coração que não batia estremecer. — Não é um qualquer animal de rua com o sangue vivo nas veias. — Era assim que se referia a humanos.

O pintor pareceu não vacilar, e dirigiu ao senhor uma vénia singela e de reconhecimento. — É certo, seria impossível encontrar beleza tal entre os homens, senhor. Mas ser-se um ser da Noite não é fenecer completamente para o mundo, como estou certo que a vossa sabedoria compreenderá, e a donzela é pois jovem e irrequieta como é próprio da idade.

A ousadia da sua voz era apenas comparada com a das suas palavras, que pareciam ignorar a sua presença. E como preferiria estar em outro lugar, se no seu quarto estaria mais segura dos olhares entre aqueles dois seres argutos e de almas calculistas, cada um desejando algo diferente para si. Oh, doce Raphael, que se perdera para ela, com as palavras meigas de salvador cavaleiro em branco corcel.

Susteve-se na cadeira: seu pai acedia; um aceno seco e desprovido de compreensão, mas um aceno. — Ser-vos-á cedida uma hora a sós, senhor. Nada mais. — Se não a disse, não faltou do seu tom sombrio a ameaça desvelada e austera. Uma promessa, Adamina garantiria.

Amapoullo sorria, se pouco sério não pôde distinguir, à luz do candeeiro, mas como o faria em frente ao homem que o ameaçava com tamanha clareza? O sorriso alargou-se quando a porta se fechou, com firmeza, e a solidão que os rodeava embraçou-a de imediato, sussurrando-lhe um arrepio.