sexta-feira, 7 de março de 2008

Capítulo I - O Pintor

3ª Parte

Fechou as cortinas aveludadas, antes do interior do coche sentir uma pequena mas inamovível inclinação para cima, como se tentasse elevar-se até ao céu nocturno. E como desejava poder tocar-lhe, ou talvez cair na latente harmonia dos anjos! No entanto, aquilo só uma coisa significava: estavam a chegar ao seu derradeiro destino.

Um alto e austero palácio espera-los-ia no fim da calçada intrépida, um retrato erguido de uma qualquer imagem aterrorizante. Ou seria a sua alma que a iludia e criava aquela figura que parecia querer devorá-la avidamente? Talvez fosse, definitivamente, só isso.

O trote dos cavalos foi abrandando, e o coche parou por fim com um solavanco pouco suave. Um dos cocheiros apressou-se a abrir a porta, veneradamente, para que descessem. Seu pai segurou-lhe na pálida mão e Adamina pôde sentir uma frieza tão igual mas tão diferente da sua. Gostaria que a sua mãe estivesse presente para a amparar na sua solidão. Perdera a única pessoa que realmente detinha carinho por si, perdera Raphael...

- Sorri – ordenou-lhe seu pai, guiando-a para as altas portas do palácio de braços dados, com passadas lentas e elegantes dignas da alta nobreza a que eles pertenciam.

Adamina tentou, mas a única coisa que sentiu foi um esgar que lhe feriu a face e lhe levou lágrimas contidas aos olhos. Não podia continuar assim para toda a eternidade, em parte o seu pai tinha razão. E lá bem no fundo, sabia que ele se preocupava consigo.

As portas abertas receberam-os solenemente, apesar de serem muitas as luzes que lhes iluminava a serpenteante carpete vermelha que os levaria ao grande salão onde o anfitrião e os convidados aguardavam a chegada dos restantes.

Caminharam, olhando em frente de forma segura. Ou assim fazia seu pai. Adamina observava os retratos que acompanhavam a sua passagem. Sentia-os diferentes do normal. Eram densos. Tinham alma...

Os seus pés pararam de caminhar, hipnotizada pelo labirinto de imagens que se espalhavam ordenada e hierarquicamente por uma inclinada e verde colina. As suas vestes eram antigas, provindas de séculos passados, algures perdidos nos confins de Belém ou Jerusalém. No cimo da pequena ladeira uma pequena e raquítica cabana erguia-se insegura no frio gélido que se passeava sem entraves por todos os seus interstícios de pobreza. No seu interior, uma mulher de beleza simples mas delicada guardava nos braços um frágil embrulho em suaves e brancos panos de linho, envolvido. Uma mãozinha erguia-se do seu interior, tentando alcançar alguns dos fios de cabelo que se escapavam do véu que os guardava. Por cima da cabana uma luz reluzia no seu esplendor divino. Mas que divino seria aquele? O seu reluzir sentia-se suavemente luciferino.

Tentou aproximar-se para observar com maior pormenor aquela grande tela emoldurada. Mas o braço de seu pai impediu-a, relembrando-lhe de onde estava, chamando-a a si e ao seu mundo que nem deveria ser seu.

- Desculpe – murmurou, mas talvez se dirigisse ao menino Jesus na sua cabana friorenta, e não ao pai. Fora a ele que perscrutara sem permissão, nos seus perfeitos pormenores. Merecia o seu pedido de perdão.

Sentiu-se a ser semi-arrastada por aquele corredor largo de paredes pálidas. Inexoravelmente, a cena sagrada afastava-se de si, assim como Ele o fizera.

7 comentários:

Unknown disse...

muito bem. boa e grande continuação :Ç

Como uma ferradura que me obrigará a continuar a maravilhosa leitura. Tens umas frases bem formuladas e sabendo das condições em que escreveste é admirável.

Leto of the Crows - Carina Portugal disse...

As aulas de IAED (Introdução a Algoritmos e Estruturas de Dados) são definitivamente sublimes *cof cof*

Muito obrigada ^^

(Mas a Kath escreve melhor =P )

Kath disse...

Oh, Leto, que mentira. Escreves bem melhor, as tuas descrições, metáforas e comparações são deslumbrantes. Portanto deixa de ser coxa. Hmph.

Muito bonito. ^^

Laepo disse...

TOLAS!

escrevem a duas bem! e está excelente! adorei :)

Leto of the Crows - Carina Portugal disse...

Inda bem que gostaste =D

Laepo disse...

mais?

Hélia Pereira disse...

oi, adorei. acho que esta excelentemente bem escrito, vou acompahnar.